a experiência é multi facetada, se enverniza na regra quebrada e dá tons inesperados ao que já se achava habituado.
--
uma das minhas várias estranhices quando criança era minha relação de prazer quase masoquista com pequenos machucados.
nunca soube direito como isso se dava, mas a pele ralada, com o sangue seco cobrindo a carne exposta, me trazia sensações boas. não agradáveis, mas boas. como se eu pudesse sentir diferente uma parte minha que era invisível. como se eu pudesse ser.
pensava que os machucados eram, para mim, um símbolo de normalidade, algo esperado de crianças e, por isso mesmo, tão alienígenas na minha vida. me sentia mais normal tendo os cotovelos escalavrados em algum chão, para viver, enfim, merecedor como os outros.
nunca nenhum osso quebrado, nunca maiores problemas em função de desafios e provocações. nunca nenhum hematoma por brigas, nunca com os dedos doloridos. a vida passava por sobre minha incapacidade de levantar e impor.
--
me proibi certas coisas para não ter de lidar com certas esperanças.
(obediência nunca foi o meu forte)
sob esta luz, percebo que não gosto de reverberar, pq, no fim, reverbero em vão, apesar de reverberar, sim.
--
e a vida continua em sua vastidão sem me permitir o esquecimento, por mais esquecido que eu tente me fazer, e o mundo se faz enorme, para que eu permaneça, sem chegar, no caminho de casa.